segunda-feira, 23 de maio de 2016

amor retrô

amigos, é isso, tá decidido
cansado, assaltado, de coração partido
vou embora sem ninguém comigo
o mundo não tá pronto pra esse amor tão grande
enfim,
aqui o mundo é sereno
nada pop, nada cool,

amor retrô
que vaga conforme a lua
amor maré

amigos, é isso, refiz as malas
só livros, camisas, submarinos
a baleia desafinada pelos zumbidos
o oceano abissal dos nossos corpos indecisos
em vão,
aqui o mundo é sereno
nada led, nada pixel,

amor retrô
que vaga conforme a lua
amor maré

recua
recua
recua
recua

sábado, 14 de maio de 2016

quando todos acidentes acontecem

toda precaução é uma espécie de ódio.
toda precaução é contraditória.
toda precaução é narcisista.

você não sabe o que vai acontecer quando você cair do telhado
parece que a gravidade acaba

você desconhece o mundo depois dessa partida
suspeita-se que as pessoas sobrevivem

você ainda não viu seu próximo filho
vai que é a sua cara?

toda precaução é mercadológica.
toda precaução é recalcada.
toda precaução é paranóica.

quando conseguirmos olhar pras mãos e pros pés e não ver palmas e dedos mas minúsculos poros e linhas e pêlos e aporia colidindo com a poeira do ar,
então seremos os
próximos

quarta-feira, 13 de abril de 2016

boi tolo

Na cidade onde eu moro
mora também esse monstro
que chamam boi
mas pra mim tá mais pra polvo
que esmaga todo seu trajeto tolo
na tontura sinfônica dos seus tentáculos

Nessa cidade onde eu moro
se escuta todo ano
seu mugido violento, bruto monstro proibido
sempre desde sempre
desprendido
agarrando os bares e os tontos
fagocitose suada da síncope das suas tetas
vaca profana sem cornos ou caretas
avança através de qualquer parede

Nesse transe esquizofrênico de fritados colados por purpurina
Nessa terra em ebulição bovina
todos se tornam também esse dragão
não rebanho, mas matilha
não cardume, constelação
e eu no meio desse monstro sem centro
no centro da cidade sem meio
no risco absoluto desse chão
que retorna a terra, sem ser terreno
território sem não
olhei pra todos os lados apenas pra te procurar
no grosso, um
mesmo

que você
não sai da minha cabeça
e o desejo psicopata
de amar com cada parte
cada pata
cada presa
cada garra
batucada desprovida de marcação
coração atravessando o marcapasso
passo sem direção

repete na minha pele
- você toda doce suada só seguindo em frente
não sai da minha cabeça

quinta-feira, 3 de março de 2016

imagina em Cuba

Não
sei
se você já reparou
mas eu solto pêlo quando durmo
muito pêlo
e você solta muito cabelo

daí
aqui
em SP, achei
um cabelo seu na minha roupa

pena
que foi
só um só


cabelo, não

você

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

restante amor

resta eu te escrever, meu amor
resta eu te dizer o quanto eu te amei
e amo
aquele amor
que quer socar sua cara
e te tirar da foto

resta te afogar
no jardim do MAM
e dizer que a alegria do palhaço
é ver o circo pegar fogo
aquele amor
de subir em poste
que quer tomar porrada da polícia se for preciso

resta eu te escrever qualquer porra
amor
qualquer porra minha
que escorra pelo céu escuro
que rasgue seu rosto
que seja beijo e pau duro
e que você finalmente morra

resta dizer que a felicidade é tanta
que o amor transborda tanto
resta transbordar todos os buracos
todas as lajes e espaços
todos os cantos de toda a cidade
todo o carnaval das carnes e dos bares
e das purpurinas douradas

resta te matar
e me matar
e acordar
pra nunca mais
resta

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

presságios na zona sul

E sem decidir como escrever minha história
está muito difícil escrever
olho amigos tampouco eles estão melhores também como folhas novas secas pisadas craquelando
Sinto presságios

Nos desejos recalcados seculares telúricos reboando nos subsolos da cidade e prontos para ejacular lava dos orifícios encanamentos proibidos
Nos talheres de prata quebrados familiares tradicionais tilintando pelos corredores do castelo nas escadarias das universidades nos fortes históricos nas masmorras dos olhos dos pais
Nos socos violentos voadores que velejam os ventos de inveja e luxúria pelas bordas das asas das borboletas - como já disseram
Nos fundos das festas sufocados de gemidos agudos agulhas genitálias babando fundo nos corpos dançantes
Na saudade & tortura & gozo das fotografias analógicas; pra que serve minha carteira de motorista, meus óculos novos, os prêmios universitários, o número da previdência social, os cálculos das tarifas bancárias, as copas de escritórios com coleta seletiva e campanha de agasalho e adoção de animais fofinhos...?
Nas prateleiras mesas computadores almoxarifados terabytes ambulantes desesperados repletos cobertos de foster wallace, miguel gomes, marcio abreu, ginsberg, burroughs, borges, godard
Nos prédios de manhanttan, seus mapas de metrô esgoto linhas de ônibus ataques terroristas como cartografias móveis avançando pelas sinapses da mente gerando trovoadas que decepam os nomes de personagens de fotos de turma, excrementos em forma de novos endereços, cartas de amor talvez
Nas batalhas virtuais perdidas são sempre perdidas e o sôfrego sofrer repetitivo sobre a enorme vontade de ser dos seres
No religioso risco dos esportes radicais, no sagrado voar das aves e das nuvens (especialmente sobre os morros verdes da zona sul), nas trágicas ceias de natal repletas de peru e vinho e família, na bíblica inflação dos aluguéis, nos proféticos livros de deleuze & guattari e críticas aos livros de deleuze & guattari, no helênico ciclo-ativismo, no lindo traço dos lápis 2B S2, na heróica editora cobogó, queria listar mais
Nos olhos cinza-sinceros semi-sorrindo dos amigos perdidos morando mal, sentem sede na boca e no rabo, fugidos, imigrantes tristes empilhando empilhados passos de jabuti na europa dos corações sangrantes e nas trocas de namorados, me sinto trocado, eu sei os segredos, quem me dera não errar dessa vez
Nos distúrbios mentais dos seus olhos cinzas & cabelos lindos em praças do rio som de coco & maracatu prédios prédios prédios adeus soçobrados sobrados adeus ninguém aguenta olhar pra cima tanto tempo tudo sobe, os preços e os prédios
Nas lentes lindas da minha câmera analógica vejo meu avô e meus amigos nus como índios, greve dos garis e chorume concentrado de um milhão de reveillons pentecostes copacabana
Nas selvas dos miolos dos pentelhos dos estudos dos cabelos dos sistemas de pensamento do apichatpong das músicas do frusciante dos desejos complicados complicadíssimos
Na música eletrônica ~~~~~~~~~~
No seu beijo e baba e bunda e fundo e tudo que não cabe no seu quarto armário apertados bichos de pelúcia patrulhando a seborréia que escorre interminável do seu orgasmo galático derretendo nossa cama de cacos de vidro sobre os azulejos hidráulicos históricos do piso que seus pais escolheram, somos putaria jurássica