Todas as minhas forças
se esgotam como que descesse de um tobogã, como um índio numa
metrópole.
Eu sinto o meu
naufrágio do seu lado, a minha impotência aguda diante da sua
impassível vontade de me dar um soco, de gritar na minha cara: seu
broxa.
Dançar só não serve,
ela disse, e tudo caminhou para onde estamos agora. Que adianta o
resto, me perguntou, me perguntava. Sou um bandido numa periferia.
Desprezível, merecia ser pisado por saltos de putas até sangrar, as
mãos e os pés, como um cristo, sangrando pelas ruas sujas das
beiradas; essa imundice de quem não sabe dizer um por favor um
obrigado sem ser irônico, não consegue dar um beijo já pensando em
trepar, tem que arranhar a canela quando joga futebol: por quê?
Onda de ácido
queimando a cabeça é como um choro aberto – você não pode
fingir que não está fingindo. Não dá pra escapar, não dá pra
fugir. O corpo morto levanta-se rápido, como que impelido por algum
maquinismo, como se uma mão poderosa lhe segurasse os cabelos e
dissesse gritasse no seu ouvido:
…
Não escutei! Não!
Fala mais alto, a música está quebrando os meus tímpanos, tão
alta que parece que saí de mim mesmo, nem tenho certeza se a música
está ligada ou não, só eu pareço escutá-la e ela reverbera nas
minhas costelas, infla os meus músculos e eu me transformo na
própria música, cada nota é uma articulação, cada osso responde
a um acorde, cada gesto meu vira um harmônico e cada dor, cada calor
ou frio é uma dissonância bonita naquele arranjo desajeitado. As
drogas batem forte, meus olhos marejados, perolados, avermelhados,
arroxeados, bronzeados – aceitei, violei as leis da natureza com
uma gozada prematura: sou inútil como um óculos escuro. Uma
fotografia de um fantasma.
Chega de diários? Não
sei fazer se não isso: todo dia a mesma rotina, todos os dias,
aqueles dias felizes, dias felizes que virão.