quarta-feira, 24 de março de 2010

Janela incompleta

O que me devora é o seu cheiro
O que me excita é o seu cabelo
O que me envolve é o seu espaço
O que me alimenta é o seu miado
de gata gaga engaiolada
O que me atormenta é o seu semblante
O que me entorpece é a suas costas
O que me encruzilha?
Inda não sei
O que me vai de volta é a vossa voz
Acho que é hora de se acarinhar
Onde o vento que balança a sua saia?

segunda-feira, 22 de março de 2010

Irmão, meu irmão

Irmão, irmão meu
filho de mesma mãe e pai
cresce, esquece, e vai
não pense no que já morreu

Vamos viver dos amores
das cantigas de Orfeu
subindo, sozinhos, nos nossos sofreres
ao mais alto andar dos arranha-ceús

Entendo os seus quereres,
caprichado e zeloso irmão,
mas é hora de andar na contra-mão.

Ergue esse rosto bretão!
Espalhemos nossas mentes, sementes,
qual Cosme e Damião.

sábado, 20 de março de 2010

Herói

Há mó tempão
rolava um maluco
(aquele macaco do 2001)
que catou um osso de merda
virou prum bonde
de uns sete viados
e disse:
"eu contra rapa!"
e desceu a porrada nos maluco

Papo reto

(pô, nem discutam
esse poema é com certeza pior que 2001)

Poeta Playsson

sábado, 13 de março de 2010

Acidentado

O circo chegou num barco
e de cara
a zona portuária
virou o point da galera indie

Traziam - o circo, não os indies -
barris e barris de pólvora
feitas no Paquistão
- fogos de todas as cores!

"Pra maiores de dezoito anos"
dizia a classificação etária
mas claro quer rolou um montão
de gente com identidade falsa...

Era dezoito anos
só porque a princesa Bradubuldur
dançava nua em pêlos
entre véus, ventres e bolhas de sabão

O show começava com uma banda
de rock muito underground
composta por cinquenta e um caras e meio
(porque um deles não tinha pernas)

Luzes e fogos, entram os animais!
Dumbo e Ganesh, os elefantes;
Mickey, Minie, e os pulantes de Hamelin
Nero, Pumba, Tião e suas fezes!

Equilibrava-se, quixote, o espantalho
numa corda, em cima
da bicicleta de Duchamp
com seus pés de curupira

Depois, surfando numa piscina
de jacarés cheios de borboletas nas bocas,
veio o dotado domador David,
que matou Golias no fim do seu número;

Trezentas mil quatrocentas e doze
pulgas pululavam pelos pirulitantes trapezistas
nus e cegos, que declamavam
cantos gregorianos e poemas de Gregório de Mattos;

Do céu de lona choveram fios prateados,
quando as equilibritas virgens
se masturbaram de cabeça pra baixo numa corda bamba
ao som de Atom Heart Mother;

Sete carpideiras bêbadas desmoronaram o público
enquanto existencialistas se contorciam
dentro de suas prisões de liberdades
e frases nietzschianas foram encontradas dentro das pipocas

Os Cavaleiros do Apocalipse baixaram
em médiuns na platéia,
e o espírito de Caim matou todos
que se chamavam Abel - ou Abelardo

Então saiu um mágico do chão
e, como truque final,
fez o dinheiro de todos aparecer
em suas cuecas e meias!

Citônio saiu transformado!
Sentia-se cheio de cidade - acidentado!
(porque não pode ser acidadado, né?)
Citônio: acidentado pelo circo!

quinta-feira, 11 de março de 2010

Cacilda

O muleque tava andando por ali
perto daquela academia perto da farmácia
e pisou na maior merda
que tinha na cidade

"Caralho! - digo, merda!"
A parada era feia mesmo.
Mas aí ele sentiu
um tremelique estranho:

Aquela merda enorme
era orgânica, verde, saudável
e o muleque se sentiu mais uno
com a natureza
meio hippie.

quarta-feira, 10 de março de 2010

João Pirralho

João Pirralho era uma aberração pra sempre
na oitava série
O cara catou catapora com catorze anos!
Teve uma vez que chutou um cachorro
porque riu do seu arroto

Ele morou na rua, até os sete anos
e não foi pra escola
foi a escola que foi pra ele
na forma de um pássaro!
feio e remelento - acho que era um pombo...

João Pirralho era uma aberração pra sempre
no ensino médio
mas foi trocado por um mês grátis de academia pela mãe
e teve que escolher ser aberração
ou casado

sábado, 6 de março de 2010

A rima que falta

Encaixa perfeitamente
no espaço lhe dado ali,
no verso lha dado em mim,
poema que sigo em frente.

É a rima do de repente
que vivo quando te vi
na valsa dessa ciranda,
na dança desse repente.

Sussura-se tu daqui;
na volta, sou todo ida;
que falta tenho de ti!

Declamo-me todo a ti:
te amo, rima perdida,
a rima que falta aqui...